Foto: Gilson Vilela |
"No dia 25 de abril fomos levados ao Teatro Deodoro para prestigiar a estréia do cantor e compositor Luiz de Assis à frente do espetáculo intitulado “Chamada”. Tal estréia foi marcada por muitas expectativas e tensões por parte do público fiel da banda Vibrações, que se viu ameaçado a uma condição de orfandade: durante todo o tempo de preparo e divulgação do show de lançamento da carreira solo de Luiz, houveram insistentes questionamentos em relação a um suposto fim da banda Vibrações, ou se Luiz a abandonaria - o que daria no mesmo.
Apesar das respostas se darem no sentido de tranqüilizar o público, ao dizer que ele daria conta dos dois trabalhos, o receio não se dissipou. No dia da pré-estréia no Teatro Linda Mascarenhas, local onde aconteceu um ensaio aberto do show, a única pergunta feita no momento que se abriu espaço para possíveis questionamentos foi: “e a banda Vibrações?” Parece exagerado tal receio. Porém, se pensarmos que Alagoas é uma terra que, apesar de linda, é mal administrada, mal vista externamente e que inevitavelmente nossa identidade enquanto alagoanos não tem muitas referências em que se apoiar na atualidade (já que a história de resistência, de luta e de conquista que temos não nos é contada), percebemos que de fato a Banda Vibrações galgou um espaço antes inexistente na representatividade alagoana. Hoje nos vemos nas letras, no sotaque, no próprio reggae, que sempre foi uma música popular na periferia de Maceió, porém poucas vezes admitida pela elite, e a possibilidade disso se perder pra dar lugar a outra coisa, de fato, gera tensão.
Assim foi então, o dia da estréia oficial da carreira solo de Luiz de Assis: cheio de interrogações. Mas não por isso, ou até por isso mesmo, o teatro encheu. Encheu-se de cores, gerações e vozes de pessoas mais diversas. Curiosos, freqüentadores de shows mais formais e, principalmente, do público fiel de Vibrações, muitos dos quais nunca haviam pisado num teatro.
O silêncio que precedeu a abertura das cortinas deu lugar a um inebriante envolvimento com a roda de capoeira que nos recebeu e nos situou como parte daquele lugar, num convite através da ‘chamada’ de Angola. Finalmente, a familiaridade da voz rouca de Luiz nos fez nos sentir de fato em casa, pois apesar de toda pompa do local, do currículo dos demais músicos da banda e da magnitude das participações, lá estava a representatividade do popular. Do popular de verdade, que se ouve nas esquinas, nos rádios de pilha, nas rodas de samba, nos batuques improvisados. Samba, batuque, soul, funk, Chau do Pife, Fernanda Guimarães, Bruno Palagani, os orixás... Alagoas estava no palco, na platéia, nas pilastras do Deodoro, nos sorrisos na saída, no orgulho por termos, sermos cultura.
O teatro, antes espaço quase que exclusivo das classes abastadas da sociedade, espaço de apresentações artísticas de valores inacessíveis para a maioria, ou se não, de seleto espetáculos que se enxergassem convenientes para tantos tapetes de arquitetura barroca e neo-clássica centenária, se abriu para o negro, o branco, o mestiço, o homem, a mulher, crianças, idosos e toda sorte de entidades que os acompanhavam, para quem acreditava.
Fundou-se no Teatro Deodoro, naquela noite, uma cumplicidade popular e erudita da qual Luiz se fez responsável por manter coesa. Fundou-se novo espaço de trânsito da população, um espaço avesso ao que nos impuseram. Espaço onde podemos ser felizes, pois “tantos alcançaram, de repente é nossa vez**”.
* Lwdmila Constant Pacheco
É Mestre em Psicologia Social
** Trecho da música Ser felizes, de Luiz de Assis
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